O mundo, sabemos, já não é tão grande como no tempo de nossos ancestrais. Não esqueçamos, porém, que foram eles os desbravadores com suas ferramentas rústicas. Tudo começou lá trás e não sabemos, apesar dos avanços semióticos, da antropologia, enfim da ciência, de onde viemos e para onde vamos. Somos o que somos, soma de espanto, alegrias, medos, selvageria, inocência, doçuras, amarguras, assassinos de reputações, corajosos, egocêntricos, altruístas. E nos encantamos com a lua, mesmo depois de pisada por humanos, quiçá outras civilizações.
O instinto continua a nos guiar; o conhecimento empírico é a universidade completa. O conhecimento acadêmico é essencial, mas com ele somos como cães amestrados, comandado por sistemas. Ao esquecer a metodologia do sistema perdemos até mesmo o rumo de casa. Perdemos o instinto, a intuição. Para viajar é preciso dar o primeiro passo. A fenomenologia do espírito (Phänomenologie des Geistes) foi a tentativa de Hegel de unir ciência e prática. Marx avançou na mesma direção com o materialismo dialético. A dialética não é só pensamento: é pensamento e realidade a um só tempo. Século das Luzes.
Formigas não lambem sabão. Micro-céfalas, traçam rotas, constroem lares, procriam desenfreadamente como forma de preservar a espécie. Distinguem o doce do amargo da vida. Alimentam-se de folhas, sem destruir a natureza. As formigas passeiam em locais jamais percorrido pelos humanos - esta espécie em extinção. Formigas sobreviverão a hecatombes, sem gente,sem folhas.
as folhas são poucas
aqui
uma
ali
outras (Bashô)
A voz da natureza assobia, marulha, canta, encanta, chora, clama, ri. Um homem caminha. Ancestrais caminharam, viajaram como Bashô. Como Jesus, Buda, Judas. Ajuda que vem da zoeira ou do silêncio das cachoeiras. Vida.
sobre elas libélulas
um céu cheio delas (Bashô)
Cerceado os instintos, tateamos como cegos sobre planícies e planos desvairados.
do sol o brilho
distante da montanha
sapo andarilho (J Estanislau Filho)
Não seria necessário observar, como observei, durante dias e noites, que formigas não lambem sabão. Uma lata de doce, restos de comida, flores, unissexuais e inconspícuas. Talvez por isso as formigas viajam.
Na lata do poeta tudo-nada cabe,
pois ao poeta cabe fazer
com que na lata venha a caber
O incabível (Gilberto Gil).
J Estanislau Filho
que maravilha de texto amigo Estanislau! obrigada pela partilha.
ResponderExcluirObrigado pela amável presença, Luiza. Abrraço.
ExcluirUau! Que crônica magnifica. Amei. Encantada, viu, poeta Stan. Abraço Olynda
ResponderExcluirEste comentário foi removido pelo autor.
ExcluirObrigado, Lynda. Abraço.
ExcluirExcelente texto Poeta. Verdadeira obra literária com conhecimento de causa, com análise do fato que originou o tema. Parabéns pela maneira sabia como escreve. Um abraço Luiza
ResponderExcluirMaravilha de texto! Encontrei-o num ônibus, mas como não deu tempo de ler até o final, guardei o nome do autor e acabei de encontrá-lo aqui e para minha surpresa, muitos outros! Grata!
ResponderExcluirObrigado!
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