sábado, 25 de setembro de 2021

Ladrão de Porco


 Imagem: Google

Todos conhecem o significado de ladrão de galinha. Estes pobres coitados, que vão presos, enquanto os de colarinhos brancos... Deixa pra lá.
Existe o ladrão de porco. Bem diferente do ladrão de galinha, pois roubar porco exige técnica. Porco faz um barulho dos diabos. Porco é o cão chupando manga debaixo d’água. Além de gritar, esperneia, dá coice e morde. Corre da panela como o diabo corre da cruz.
    Mas, para seu Álvaro, tarefa simples, sopa no mel. Seu Álvaro foi um pistoleiro afamado em Jampruca, nos cafundós de Minas, nas décadas de cinquenta e sessenta. Além de porco, roubava boi, cavalo, qualquer coisa.
Seu Álvaro queria comer carne de porco. Aproveitando a ausência de Seu Ernesto, esposo honrado de Dona Maria, foi lá no chiqueiro desse bom homem e pegou um à luz do dia. Um porquinho pequeno, fácil de carregar nos braços, sem necessidade de peia. Porquinho bonito, na verdade um leitão, mas ainda necessitado de engorda. Prendeu o suíno em um pequeno cercado à espera de que ele ganhasse umas gorduras.
    Como em Jampruca só se ouvia dizer, especialmente em se tratando do homem que virava cachorro (breve contarei este caso), o bochicho chegou ao ouvido de Seu Ernesto. Também ao ouvido de Seu Álvaro. A população comentava o caso a boca pequena. Isso incomodou o pistoleiro, que foi à casa de Seu Ernesto e o “convidou” a ir à sua casa, para confirmar se o porco era dele. Seu Ernesto foi, viu o porco. Olhou, apalpou o bichinho, que o reconheceu e não teve dúvidas: “Não, esse não é o meu porco. O meu tinha um focinho branco, uns pêlos loiros. Esse aí tem o focinho e pêlos de outra cor”.
    Seu Álvaro olhou bem no fundo dos olhos de Seu Ernesto, levantou ligeiramente a camisa, deixando à vista o trêsoitão e foi categórico:
    - Pois intonce, Seu Ernesto, o senhor espaia no povoado, que o porco é meu. Tô com os ovido e as zoreias quemano, sinar di qui tão sujano meu nome na praça. Tamu combinado?
    O assunto do desaparecimento do porco, com o perdão da palavra, morreu ali.


J Estanislau Filho

Obs.: Crônica caipira escrita em janeiro de 2016 e publicada no Recanto das Letras.


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