segunda-feira, 30 de maio de 2022

Das Minhas Lembranças 29



Imagem do acampamento #LulaLivre


Com a internet e as redes sociais, os fatos parecem caminhar mais rápido.  Já não levamos cinquenta anos ou mais, para apuração da verdade, embora as notícias falsas também criem asas. 

   O impeachment de Dilma, sem crime de responsabilidade, por exemplo, provavelmente só seria desmascarado muitos anos depois,  assim como a farsa jurídica-midiática contra Lula. Essa é a parte boa das novas tecnologias. 

      O que me vem a  memória, nesse caso, mais recente,  é que o golpe contra uma presidenta honesta tinha outro alvo, tirar o Lula da disputa de 2018.  Para essa tarefa, os golpistas neoliberais tinham a famigerada Força Tarefa da Lava Jato, da República de Curitiba, sob as orientações do então Juiz Sérgio Moro, com a velha e surrada mentira dos golpistas de sempre: o combate a corrupção, o mesmo argumento, para golpear nossa frágil democracia em 1964, pelos militares.  E a farsa tarefa fez estragos país afora. O PT sofreu um duro golpe. Foi mal, muito mal nas eleições municipais de 2016. 

     O desmonte das políticas de proteção social e trabalhistas dá lugar às políticas neoliberais, com a tal ponte para o futuro de Michel Temer,  que assumira o lugar de Dilma na presidência. Mas o estrago maior estaria por vir. 2018 se aproxima.  E Lula seria uma pedra no caminho dos neoliberais. A mídia corporativa, sob o comando da Globo dá amplo espaço aos dois personagens, que se revelariam posteriormente, nocivos ao Brasil: Sérgio Moro e o chefe da força tarefa da lava jato, Deltan Dallagnol. Não havia espaço para a defesa de Lula. Um massacre diário, que toda imprensa, escrita,  falada e televisada repercutiam. Até mesmo em "inocentes" programas de auditório havia espaço para destruir a reputação de Lula e dos petistas, como símbolos da corrupção.  O caminho para tornar Lula inelegível e preso fora pavimentado, com a anuência do SUPREMO.  As redes sociais foram bombardeadas por robôs, com  fake news,  patrocinadas pelos mesmos setores, que foram às ruas pra derrubar Dilma. A classe média era a principal força cooptada na mobilização. Acrescido pelo que parte da esquerda, também nas redes sociais rotulou de pobres de direita. 

    O Jornal Nacional abre um longo espaço para Dallagnol apresentar o seu powerpoint em que Lula aparece como o chefe de uma organização criminosa.  A direção do Partido dos Trabalhadores parece desnorteada.  Os advogados de defesa de Lula, Cristiano Zanin e Valeska Teixeira são constrangidos, com dificuldades de acesso aos autos do processo kafkiano . A mídia golpista deita e rola. Chove denúncias: OAS, Odebrecht Pallocci, Zé Dirceu e o famoso triplex do Guarujá, assim por diante.  O massacre parece não ter fim. Lula se entrega,   saindo de sua trincheira, na sede do  Sindicato dos Metalúrgicos do ABC. E segue para Curitiba, sem algemas, conforme negociação com a Polícia Federal.

Imagem: Google
 

      São trezentos e oitenta dias preso na superintendência da polícia federal. Organiza-se a resistência do acampamento #LulaLivre em que militantes não arredam o pé do local.  Assim como fora Joaquim Barbosa, agora o herói nacional era o Juiz Sergio Moro.  Máscaras dele são vendidas em bancas de revistas. E Dallagnol faturando  em palestras. 

     Em 2018 acontece o que talvez os golpistas neoliberais não contassem: a eleição de Jair Bolsonaro.  As peças vão se encaixando,  com Sérgio Moro sendo premiado com o cargo de Ministro da Justiça do novo governo.

Ilustração: Berzé
 

    Lula diz o tempo todo que é inocente, que Moro e Dallagnol são mentirosos.  Quando ainda resistia a prisão, no Sindicato dos Metalúrgicos de São Bernardo, fora-lhe sugerido o exílio, Lula recusou.  E finalmente foi solto. E Moro considerado um juiz parcial. Um juiz ladrão, disse  em plenário  o Deputado Glauber Braga, numa audiência. 

    Outras lembranças surgem, mas como são fatos recentes, deixo por conta das leitoras e leitores. Dallagnol e Moro estão sendo processados pelos estragos causados ao Lula, ao país e a democracia, assim como outros procuradores.

Triplex do Guarujá
 

     As eleições presidenciais de 2022 se aproxima. Lula é o líder das pesquisas, com chances de vitória no primeiro turno.  O que os golpistas de sempre farão, para impedir? 

     O governo Bolsonaro se revelou uma tragédia, levando consigo, parte das Forças Armadas.  Desemprego, fome, fila pra comprar osso, milícias, orçamento secreto, violência policial, desmatamento, destruição da saúde, da educação, corrupção e outras mazelas. 

     Com esse episódio encerro as minhas lembranças de militante petista, iniciada antes mesmo da legalização do partido. O que vai acontecer até outubro de 2022 fica para lembranças futuras. 

     À partir do próximo capítulo de minhas lembranças, contarei com foram minhas participações no movimento cultural, popular e ambiental. 



Lula Livre imagem: Sindicato dos Metalúrgicos do ABC


     J Estanislau Filho

quarta-feira, 25 de maio de 2022

Das Minhas Lembranças 28

Imagem jefil: Manifestação em São João del Rei


Com a eleição de Dilma em 2010, fiquei tranquilo.  Agora sim, pensei, o projeto de um governo popular, de inclusão social se consolidara. Não teria mais volta.  A vitória apertada em 2014 contra Aécio Neves, e com as ruas tomadas pela classe média, insufladas pela mídia, com o apoio explicito da FIESP e outros setores empresariais e do sistema financeiro,  sinalizavam dias difíceis, como de fato, foram.  Nem bem Dilma toma posse, em 2015, o golpe ganha forma. Aécio não reconhece a derrota.  Da área vip do estádio, Aécio, Luciano Huck e outras celebridades,  gritam palavrões contra a presidenta. Galvão Bueno, abre o microfone e o grito ecoa: Fora Dilma, Dilma, vai tomar no c.  Ano da copa  e o Brasil leva o famoso 7x1 da Alemanha. Em seu primeiro discurso após a derrota, Aécio, em tom de fúria golpista , diz: "Vamos obstruir todos os trabalhos até o país quebrar e a presidente Dilma ficar incapacitada  de governar, sem apoio parlamentar, aí reergueremos o país que nós queremos..." Assim, "com o SUPREMO, com tudo",  como disse Romero Jucá (MDB), Eduardo Cunha coloca o impeachment em votação. É o ano de 2016. Como previra Aécio, Dilma não conseguiu governar em 2015. 
     Acompanhei tudo pela TV e pela internet.   A consciência política me tirou das redes sociais e voltei às ruas de São João del Rei e de  Belo Horizonte. Houve resistência.  As ruas foram tomadas pelos vermelhos, em contraposição aos verde-amarelos. Em São João, participei de duas manifestações, com passeata. Fui a uma em Belo Horizonte, com mais de cem mil. Mas o golpe, planejado em detalhes,  se consumou, com os deputados federais comemorando de forma grosseira.  Bolsonaro, em seu voto, homenageia a memória do torturador Brilhante Ustra.

Imagem: Google

     Temer-MDB- vice de Dilma toma posse e dá início ao desmonte das conquistas sociais, ambientais e trabalhistas dos governos Lula e Dilma, com o programa Ponte Para o Futuro, que dá título ao meu poema:


ponte para o futuro

bom para quem fatura

nas costas dos trabalhadores...


não quero esta ponte

pois ela vem da fonte

de ladrões e traidores...


na ponta desta ponte

só há quem apronte

efeitos devastadores...


esta ponte de armadilhas

atravessam as quadrilhas

e a turba de impostores...


nesta ponte não atravesso

pois sempre fui avesso

a corruptos e corruptores...


Imagem: Google

     Enquanto isso, dois personagens entrariam para História: O Juiz Sérgio Moro e Deltan Dallagnol.  O que eles queriam, com o discurso anticorrupção e Lava Jato, irei relembrar no próximo capítulo. 


J Estanislau Filho


domingo, 15 de maio de 2022

Das Minhas Lembranças 27


 Imagem: Carta Capital

Como disse anteriormente, em 2006 me afastei da militância político-partidária e fui cuidar de minha saúde. Em 2007 retornei ao  Ponto Cósmico, refúgio em Esmeraldas. Foi um período de reflexões sob as sombras dos pés de pequis, na companhia de miquinhos e de uma diversidade de pássaros e árvores do cerrado. 
     A ideia de me desfiliar,  adiada por conta da conjuntura difícil que  o PT passava, foi ganhando forma.  Só em 2009 redigi o primeiro rascunho da carta de desfiliação.  Apesar da crise de 2008, o governo Lula e o país iam bem, com altas taxas de aprovação popular e credibilidade internacional. 
     No dia 13 de janeiro de 2010 a carta ficou pronta, no momento em que as pesquisas indicavam Lula com mais de 80% de aprovação popular.   O dia 13, evidentemente, não foi por acaso. Toda ruptura traz sofrimento e pode deixar sequelas. Não era apenas sair do partido, que ajudara a construir, era sair de um projeto de governo em benefício de todas e todos.  Também  pelo sentimento de ver tal projeto ético ruindo. Havia outros planos, como por exemplo de voltar aos meus rabiscos literários.  E tempo livre para a saúde e o lazer.  
     Mesmo limitado, fiz uma campanha tímida, do meu modo, para a eleição de Dilma Rousseff .  A mídia corporativa continuava batendo sem complacência  no PT, sedimentando na consciência da população o sentimento antipetista. 
     O sonho de morar em uma cidade pequena, sossegada  realizou-se em 2014. Decidi por Coronel Xavier Chaves, também conhecida por Coroas, com a ajuda de Berzé, que me apresentou o município, localizado no Vale das Vertentes, próximo de Tiradentes e São João del Rei. Antes porém, tive a companhia do meu irmão, Lalá, num tur por alguns municípios da região. 
     Aí aconteceu de eu ser abordado pelo Suerlei, um dos três vereadores do PT de Coroas, para informar, que a minha ficha de filiação fora transferida. Uai, como assim?, eu não sou mais filiado, respondi.  É sim, confirmou o vereador.  A minha carta de desfiliação não fora aceita pela direção do partido.  Continuo filiado e assim permanece, mas fora das lutas e disputas internas.  
     E foi nesse ano de 2014, que a bandeira de Dilma Rousseff, candidata a reeleição, tremulou no muro de minha nova morada.

Imagem: acervo do autor

     Aí, né? veio 2015 , com o Aécio Neves não reconhecendo a derrota, Eduardo Cunha, Lava Jato e a mídia corporativa.  Tudo junto e misturado num projeto golpista, que culminou na queda de Dilma em 2016. 

J Estanislau Filho

Carta de desfiliação


segunda-feira, 2 de maio de 2022

O Comedor de Livros


 Capa: Roberto Caio F Estanislau

Lia livros e mais livros
Com olhos e boca
A cada livro que lia
Em seguida o comia

Comia com olhos – que a terra há de comer
Com boca e dentes para melhor entender

Comia-os como sanduíches
Com mostarda e catchup
Tragédias dramas
Qualquer trama
Para compreendê-los
Bom mesmo era comê-los

Sentiu forte emoção
Em Cem Anos de Solidão
Com Ulisses ficou aturdido
Em Busca do Tempo Perdido
Sentiu um misto de tristeza e alegria
O que não aconteceu em A Escolha de Sofia

Comendo Vastas Emoções e Pensamentos Imperfeitos
Sentiu-se farto satisfeito
Com Orlando – metade homem metade mulher
Despediu-se com um aceno
Para comer A consciência de Zeno
E comeu com regozijo Enquanto Agonizo
Ao comer o Deserto dos Tártaros chorou
Comeu Poema Sujo
De Pessoa comeu os heterônimos
Comeu autores anônimos

Com As Flores do Mal
Sentiu um apelo um sinal
E comeu Lima Barreto Bandeira Sartre e Machado
Castro Alves Maiacoviski e Callado
E comeu Rimbaud Sthendal Camus e Afonso Romano
Comeu por engano discos do Chico e do Caetano
E comeu Saramago Cecília Amado Dikhinson e Adélia Prado
Becket Dos Passos Chaucer Kafka Verlaine e Arrabal
E comeu toda biblioteca municipal

Devorou as livrarias da cidade
E após uma certa idade
Sentindo-se mal
Foi levado às pressas ao hospital

Morreu na fila por falta de atendimento.

J Estanislau Filho



Do livro: O Comedor de Livros - 1991- Edição do Autor - Esgotada

sem título

Imagem: Google

tenho às vezes no olhar a amplidão
dentro do peito a sofreguidão
tenho as frases e os dias
em minhas mãos
tenho seu sorriso
seu brilho lumiando meu chão
uma vida
muitas vidas
mil vezes redimida
tenho que chão sob os pés
o espaço a imensidão
um sorriso de menino
a alegria de um nordestino
incrustada no coração


J Estanislau Filho

Do meu livro O Comedor de Livros - 1991




 

Fotografia UOL