embrulhamos nossos sonhos
em estampas coloridas.
nossos desejos mais secretos
expostos em vitrines
refletem nossos afetos.
para a filha uma boneca
para o filho um carrinho
para a família muita luz
pão e vinho
uma prece pra Jesus
J Estanislau Filho
J Estanislau Filho
PASCOAL SOTO
J Estanislau Filho
Uma breve mostra do que você irá ler em A Construção da Estradada de Ferro, meu próximo livro a ser lançando no segundo semestre de 2021.
Aguardem!
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J Estanislau Filho
Contagem, 03 de novembro de 1989
O Comedor de Livros, meu terceiro livro semi-artesanal - 1991
Em 2021 A Construção da Estrada de Ferro (Romance)
J Estanislau Filho
Rubem Alves
Imagem: Google
Quando a Fátima Bernardes saiu do Jornal Nacional, aplaudi. No meu modo de entender, ela não combinava nem um pouco com o seu parceiro de bancada, Bonner. Creio que ela não se sentia confortável ao lado de ator-marido. Sim, Willian Bonner é um ator. Não sabia, que por detrás da decisão de Fátima, tinha uma desavença amorosa. Desconfiei que o seu desconforto seria de natureza ideológica, pois o JN, desde o seu nascimento, faz um jornalismo canalha. O Willian Bonner é o que melhor cumpriu o papel de canastrão. Me lembro bem de sua atuação no chamado mensalão do PT. A música de fundo, o cenário com montanhas de dinheiro saindo do esgoto, seus gestos acompanhados de palavras raivosas. Enquanto o Bonner gritava espumando ódio, a Fátima mantinha os gestos comedidos. Não sabemos, talvez não saberemos nunca os reais motivos do afastamento de Fátima do Jornal Nacional. A TV Globo, que teve sua concessão pública concedida pela ditadura militar de 1964, para defendê-la e desde sempre faz um jornalismo seletivo, golpista.
Consumado o golpe que afastou uma presidenta honesta, a Globo e toda mídia empresarial se concentraram num massacre contra o ex-presidente Lula, até que novas, eleições foram realizadas e um extremista de direita alçado à presidência. E o Bonner troca de papel. Sai o indignado e raivoso, para dar lugar ao bom rapaz, de voz suave, quase inaudível, sobre os eventos do novo governo. Um expectador atento observa a mudança. O objetivo foi cumprido, não faz mais sentido a postura de ódio. Afinal o Jornal Nacional cumpriu o seu papel golpista, tem um governo que atende aos interesses da Globo e do sistema financeiro. Bolsonaro faz as patacoadas, para distrair a manada; Guedes vai privatizando tudo; Ricardo Sales abre a porteira pra boiada passar e o agro é pop a nos intoxicar, inclusive com fumaça.
Mas e a Fátima Bernardes, título desta crônica, o que a levou a sair do JN? Você minha cara leitora, meu amigo leitor, tem um palpite?
J Estanislau Filho
Estava deitado na rede da varanda de nossa casa, contemplando o jardim e as aves miúdas que brincavam e procuravam alimento na grama e nas folhas das palmeiras. O que era pra ser uma simples distração transformou-se em reflexão. Destruir o jardim que levara anos a se formar, bastaria algumas horas. Mesmo hoje, com tecnologias avançadas, construir uma escola, um hospital ou um condomínio residencial consome um bom tempo de trabalho e grana. Mas meus pensamentos se fixaram na construção de uma casa simples, básica, porém digna de ser habitada por uma família pequena. Afinal, hoje em dia as famílias não são numerosas. Pensei numa casa de três quartos, sala, cozinha, um banheiro, área de tanque, uma varanda. Cômodos pequenos. Pensei num quintal, onde tivesse espaço para uma cadela, ou um cão. Prático, também pensei numa pequena horta: uns pés de couve, cheiros, essas coisas.
Para essa construção é necessário um planejamento. Um engenheiro desenha a planta; um pedreiro, que além de pedreiro é eletricista, telheiro, bombeiro hidráulico é contratado. Supondo que o dono da obra levara anos economizando e tenha a grana suficiente para bancar a construção. Beleza. Inicia-se os trabalhos. Tijolos, areia, cimento, ferragens, tinta, portas e janelas, enfim, tudo à disposição dos trabalhadores.
Quanto tempo levarão pra concluir a obra? Considerando que os trabalhadores são feras, em algumas semanas já bateram a laje. Agora é necessário uma pausa, para a laje se firmar. Depois de alguns dias, podem retirar o escoramento. Nesse ínterim assentam marcos, portas e janelas. Para não alongar a narrativa, a casa está pronta pra ser habitada. A casa ficou pronta em cinco meses. É muito? Dois meses, menos que isso é improvável. Hora de mobiliar. Os moradores estão felizes. Eis que um outro personagem surge na história.
Trata-se de um cidadão de posses. Ele gostou do local da construção. "Vou lucrar muito, comprando isso", pensa. E se apresenta interessado em adquirir o imóvel. Com seu faro especulativo, oferece xis. O dono recusa. Mas o empresário na verdade é lobista de uma grande construtora. Usa todos os "recursos" disponíveis para pressionar o proprietário, que não resiste. Vende a casa, duramente construída.
O novo dono bota tudo abaixo. Em uma semana? Não, ele tem pressa. Em dois dias a construção é demolida, para dar lugar a um prédio de dez apartamentos.
O pensamento, sim, estava apenas pensando, enquanto contemplava os passarinhos no jardim. Tudo isso me levou ao seguinte questionamento: quanto tempo e recursos foram necessários para construir a Petrobras? Para construir portos e aeroportos? Malha rodoviária e ferroviária? E o Sistema Único de Saúde, popularmente conhecido por SUS, quanto tempo e recursos foram necessários?
Então conclui: construir demora. Destruir é rápido.
J Estanislau Filho
Imagem cedida por José Carlos
J Estanislau Filho
Encontrou-o no quarto, um tanto quanto encolhido na cama espaçosa, olhando aleatoriamente a televisão, com aquele tipo de olhar que dá a impressão de nada ver. O barulho da porta fez com que virasse levemente a cabeça e observasse a sua entrada. Um sorriso meio sem vontade apontou no rosto emagrecido.
– Vim te ver, meu tio.
O velhote acomodou-se nos travesseiros, entre desconfiado e surpreso. Ele, propriamente, não sabia o que dizer, a não ser fazer umas perguntas sobre a situação do tio, que terminara sozinho, naquela clínica acanhada. Lembrava-se bem da época em que ele arrotava grandeza. Lembrava-se bem do desdém que demonstrava em relação aos que não considerava vencedores, como ele.
– Estão te tratando bem aqui?
Uma das mãos levantou-se num gesto vago, indefinido, os olhos meio que se fecharam, depois abriram-se lentamente. Aquele parente sempre o desconcertava, fosse no sucesso, fosse na decadência. Sim, era assim que o via agora, triste e esquecido. Explicou-lhe que ia viajar em seguida, de volta para casa. Saiu pensativo, estaria ele captando algo, naquela altura dos acontecimentos?
Encontrou a dois passos da clínica uma casa de cestas de presente, cestas caprichosamente adornadas, com conteúdos apetitosos: frutas, doces, mimos diversos. Comprou uma e pediu que entregassem no quarto do tio. Aquela iniciativa atenuou o desconforto que experimentava, enquanto se distanciava da cena que acabava de vivenciar.
Beatriz Mecking
Beatriz Mecking é pelotense, mestra em Teoria literária pela PUC-RS. Aposentou-se como professora do Departamento de Letras da UFPel. Tem quatro livros publicados: Tempo de Renascer (contos, 1997), Histórias do Cotidiano (contos, 2001), Os passos de Júlia (novela, 2008) e Curtas Histórias (minicontos, 2014).
Pertence a várias academias de Letras e participa do Recanto das Letras (Béti Mecking).