quinta-feira, 25 de abril de 2019

Itália e Portugal comemoram o fim de suas ditaduras enquanto o Brasil bolsonarista quer celebrar o início

                                         Marcha contra o fascismo em Milão

Por Donato


O dia 25 de Abril marca o fim de duas ditaduras na Europa. Na Itália e em Portugal.

A lembrança e comemoração da data revelam a enorme diferença que ainda há entre aqueles dois países e o Brasil no que se refere ao tema.

Hoje em Portugal celebra-se os 45 anos da Revolução dos Cravos, que pôs fim na ditadura imposta pelo “Estado Novo” de Salazar (são curiosos esses movimentos batizados com ‘novo’ ou ‘nova’, quando surgem pode crer que vem coisa bem velha e antiquada).

Em Portugal é feriado no país todo e neste ano haverá ainda a inauguração de um memorial em homenagem aos presos políticos. O local era um presídio durante os anos do regime autoritário. Fica a pouco mais de 100 km de Lisboa e tornou-se símbolo da repressão.

Um painel será instalado com os nomes de todos os 2.510 opositores ao regime fascista que ali ficaram detidos e ainda haverá uma exposição intitulada “Por teu livre pensamento”, com memórias da ditadura portuguesa.

Manifestações ocorrem todos os anos por todo o país e para o ano que vem está prevista a criação do Museu Nacional da Resistência e da Liberdade.

Na Itália, o 25 de Abril é dia oficial da libertação das garras do nazi-fascismo de Mussolini e Hitler, feriado nacional, com festejos e atos dedicados a não permitir que a memória seja enevoada.

Ainda que boa parte da população mundial tenha uma visão formada pela narrativa que situa o exército americano como o herói que expulsou o vilão, italianos sabem que em várias regiões a libertação se deu pelas mãos de civis que pegaram em armas e venceram as tropas nazi-fascistas.

Sobretudo no norte, onde durante vinte meses as batalhas foram cruéis entre pelotões fortemente armados contra jovens de pistola em punho que rejeitavam o governo fantoche de Mussolini e sua fictícia República de Saló.

Os exércitos dos Aliados muitas vezes chegaram bem depois de partigianos da resistência já terem libertado as cidades ao custo de fome, frio, sangue e muitas vidas.

“Se quiserem andar pelos lugares onde nasceu nossa Constituição, devem ir às montanhas onde morreram partigianos, devem ir nos cárceres onde foram aprisionados, nos campos onde foram assassinados”, disse Piero Calamandrei em seu discurso de janeiro de 1955.

Essa é a enorme distância que existe hoje em dia entre o Brasil e duas nações que aprenderam com os erros. Uma distância bem maior que o Atlântico.

Enquanto locais marcados pela repressão tornam-se memoriais, por aqui o Doi-Codi até hoje é uma delegacia.

Enquanto lá comemoram-se as datas de libertação, por aqui há uma turma querendo celebrar a data de enclausuramento da democracia que por mais de 20 anos sofreu torturas e deixou desaparecidos e famílias destroçadas.

Sim, é certo que na Itália de Matteo Salvini a extrema direita anda colocando as asinhas de fora e torcendo o nariz para as comemorações do 25 de abril. Isso causou o cancelamento das festividades em algumas pequenas cidades por precaução a conflitos.

Mas nem um radical como Salvini se atreve a elogiar o nazismo ou o fascismo nem seria imbecil suficientemente para vociferar “Viva il Dulce” no microfone do Congresso.



Fonte: https://www.diariodocentrodomundo.com.br/italia-e-portugal-comemoram-o-fim-de-suas-ditaduras-enquanto-o-brasil-bolsonarista-quer-celebrar-o-inicio-por-donato/

quarta-feira, 17 de abril de 2019

revelação

                                                             imagens: google


Para José Prado


vamos diga
baseado em que
trilhas as trilhas dos sonhos e dos delírios?
baseado em que
buscas soluções em viagens distantes?
baseado em que
queres e não queres o tanto faz?
baseado em que
não estás aí ou andando?

olha
receio não estejas te expondo o suficiente
que tudo isso seja para encobrir algo
e que na verdade
[ah a verdade, o que é verdade?]
estás envolvido numa grossa camada
impedindo que te vejam em tua plenitude

olha
não quero que escondas nada
[para que haverias de esconder alguma coisa?]
quero mesmo que te exponhas
que mostres tua face aos homens
e que o teu corpo
esteja à mostra
para que todos o exultem
ou escandalizem

quero mesmo é que tu te ames.


J Estanislau Filho


Do livro Três Estações - 1987



sábado, 13 de abril de 2019

SENDO ASSIM...

                                                          imagem cedida pelo autor



Se você me pedir uma mão
com certeza dar-lhe-ei as duas.
Se com fé me apertar cinco dedos
dou-lhe mais cinco, apertando mais.
Sim... Suas boas atitudes
olho com dois bons olhos.
Ouço os seus doces planos
com dois ouvidos atentos.
E se você me chamar pros seus braços,
com meus dois braços, eu abraço-lhe!

Só não chuto as pedras do caminho
com os dois pés, porque senão caio...
Posso até dar-lhe duas estrelas,
dois sóis, duas luas, dois oceanos...
Dedicar-lhe dois sonetos of best,
duas canções inesquecíveis,
um céu aqui na terra
e outro céu no paraíso...
Só não lhe dou dois corações,
porque tenho somente um!


Dilson Ferreira da Silva

25/09/2015

Contato:

dilsonfs51@hotmail.com

www.recantodasletras.com.br/autores/dilsonpoeta


                                                       Imagem cedida pelo autor


segunda-feira, 8 de abril de 2019

Os 100 dias de um idiota no poder




Por Jessé Souza


A eleição de Jair Bolsonaro foi um protesto da população brasileira. Um protesto financiado e produzido pela elite colonizada e sua imprensa venal, mas, ainda assim, um "protesto". Para a elite o que conta é a captura do orçamento público e do Estado como seu "banco particular" para encher o próprio bolso. A reforma da previdência é apenas a última máscara desta compulsão à repetição.

Mas as outras classes sociais também participaram do esquema. A classe média entrou em peso no jogo, como sempre, contra os pobres para mantê-los servis, humilhados e sem chances de concorrer aos privilégios educacionais da classe média. Os pobres entraram no jogo parcialmente, o que se revelou decisivo eleitoralmente, pela manipulação de sua fragilidade e pela sua divisão proposital entre pobres decentes e pobres "delinquentes". Juntos, a guerra social contra os pobres e entre os pobres, elegeu Bolsonaro e sua clique.



Foi um protesto contra o progresso material e moral da sociedade brasileira desde 1988 e que foi aprofundado a partir de 2002. Estava em curso um processo de aprendizado coletivo raro na história da sociedade brasileira. Como ninguém em sã consciência pode ser contra o progresso material e moral de todos, o pretexto construído, para produzir o atraso e mascará-lo como avanço, foi o pretexto, já velho de cem anos, da suposta luta contra a corrupção.

A "corrupção política", como tenho defendido em todas as oportunidades, é a única legitimação da elite brasileira para manipular a sociedade e tornar o Estado seu banco particular. A captura do Estado pelos proprietários, obviamente, é a verdadeira corrupção que, inclusive, a "esquerda" até hoje, ainda sem contra discurso e sem narrativa própria, parece ainda não ter compreendido.

Agora, eleição ganha e Bolsonaro no poder, começam as brigas intestinas entre interesses muito contraditórios que haviam se unido conjunturalmente na guerra contra os pobres e seus representantes. Bolsonaro é um representante típico da baixa classe média raivosa, cuja face militarizada é a milícia, que teme a proletarização e, portanto, constrói distinções morais contra os pobres tornados "delinquentes" (supostos bandidos, prostitutas, homossexuais, etc.) e seus representantes, os "comunistas", para legitimar seu ódio e fabricar uma distância segura em relação a eles. Toda a sexualidade reprimida e toda o ressentimento de classe sem expressão racional cabem nesse vaso. O seu anticomunismo radical e seu antintelectualismo significam a sua ambivalente identificação com o opressor, um mecanismo de defesa e uma fantasia que o livra de ser assimilado à classe dos oprimidos. Olavo de Carvalho é o profeta que deu um sentido e uma orientação a essa turma de desvalidos de espírito.

A escolha de Sérgio Moro foi uma ponte para cima com a classe média tradicional que também odeia os pobres, inveja os ricos, e se imagina moralmente perfeita porque se escandaliza com a corrupção seletiva dos tolos. Mas apesar de socialmente conservadora, ela não se identifica com a moralidade rígida nos costumes dos Bolsonaristas de raiz que estão mais perto dos pobres. Paulo Guedes, por sua vez, é o lacaio dos ricos que fica com o quinhão destinado a todos aqueles que sujam a mão de sangue para aumentar a riqueza dos já poderosos.




Os 100 dias de Bolsonaro mostram que a convivência desses aliados de ocasião não é fácil. A elite não quer o barulho e a baixaria de Bolsonaro e sua clique que só prejudicam os negócios. Também a classe média tradicional se envergonha crescentemente do "capitão pateta". Ao mesmo tempo sem barulho nem baixaria Bolsonaro não existe. Bolsonaro "é" a baixaria. Sérgio Moro, tão tolo, superficial e narcísico como a classe que representa, é queimado em fogo brando já que o Estado policial que almeja, para matar pobres e controlar seletivamente a política, em favor dos interesses corporativos do aparelho jurídico-policial do Estado, não interessa de verdade nem a elite nem a seus políticos. Sem a mídia a blindá-lo, Sérgio Moro é um fantoche patético em busca de uma voz.

O resumo da ópera mostra a dificuldade de se dominar uma sociedade marginalizando, ainda que em graus variáveis, cerca de 80% dela. Bolsonaro e sua penetração na banda podre das classes populares foi útil para vencer o PT. Mas ele é tão grotesco, asqueroso e primitivo que governar com ele é literalmente impossível. A idiotice dele e de sua clique no governo é literal no sentido da patologia que o termo define. Eles vivem em um mundo á parte, comandado pelo anti-intelectualismo militante, o qual não envolve apenas uma percepção distorcida do mundo. O idiota é também levado a agir segundo pulsões e afetos que não respeitam o controle da realidade externa. Um idiota de verdade no comando da nação é um preço muito alto até para uma elite e uma classe média sem compromisso com a população nem com a sociedade como um todo. Esse é o dilema dos 100 dias do idiota Jair Bolsonaro no poder.




domingo, 7 de abril de 2019

Três Estações

                                                                      Capa: Eliana



Primeira Estação


Seu olhar percorre a paisagem,
observando os locais...
Leva consigo lembranças de cidades,
pessoas e cais


Segunda Estação


Você tem a profundidade do oceano,
mistérios que não ousa revelar,
quero mergulhar em suas águas
e os seus segredos desvendar


Terceira Estação


Quando seu coração se abrir
para o mundo
seus olhos serão sementes
germinando luz


J Estanislau Filho

Do livro Três Estações-Edição do autor-1987

sexta-feira, 5 de abril de 2019

A cor do vento

                                                                 Imagem: FE






Para o meu neto Raul e a todas as crianças do mundo



Um dia peguei um punhado de vento com as mãos.
Senti o seu perfume.
Depois coloquei-o dentro de minha caixa mágica,
envolvido em papel celofane,
para protegê-lo do frio.
Eu queria saber a sua cor,
mas para isso não podia ter pressa.
Deixei-o lá trancado por um tempo.
Passado esse tempo, abri um orifício,
para que ele não escapasse.
Olhei-o dormindo sossegado, sob a proteção do papel.
Não tinha cara de assustado.
Parecia feliz até.
Mas não via nenhum matiz.
Conformado, chamei algumas crianças, 
que brincavam de amarelinha na rua,
para que elas se surpreendessem com o vento.
A criança que olhou primeiro disse: - olha, é vermelho.
A segundo discordou: - não, é azul.
Depois a terceira riu, afirmando: - é verde.
- Não, é lilás - gritou a outra.
Cada uma vislumbrava uma cor.
Em coro disseram: - Solta ele, tio!
Em seguida o libertamos entre as flores do jardim.
Enquanto elas acenavam contentes,
eu tentava entender porque eu não enxergara
nenhuma cor...



J Estanislau Filho