segunda-feira, 26 de junho de 2023

Gambiarreiro de profissão



Imagem: o autor em lançamento de Crônica do Amor Virtual em 2012


O gambiarreiro é o mestre do improviso. Às vezes funciona. Pelo menos por um tempo. É um especialista em generalidades. Sabe de tudo um pouco. Com profundidade, sabe de nada.  Com o tempo, a máscara cai. Quem nunca recorreu a um?
     O mestre gambiarreiro faz de tudo: conserta ferro de passar roupa; faz reparos na cerca elétrica; coloca telhas; faz serviço hidráulico; emenda fios;  faz reboco; pinta casa; instala chuveiro elétrico e por aí vai. 
     Tem o gambiarreiro da análise política e econômica.  Faz análise de conjuntura. Suas conclusões 'meia-boca' é uma mistura de conhecimento precário, com 'copia e cola'.  Afirma, convicto, sobre o certo e o errado. Em geral, esse tipo de gambiarreiro se acha o máximo. Mas há os modestos. Admitem ser aprendizes. Ainda que de tudo, um pouco.  Embora raros, têm os que assumem suas insignificâncias. Foi o meu caso ao consertar um chuveiro elétrico  e instalar.  Seria cômico, se não fosse trágico.  Tomei a precaução de desligar a chave do padrão de luz,  enquanto instalava. Na dúvida do que poderia acontecer ao religar o relógio, pedi à minha companheira que o fizesse, enquanto eu permanecia no banheiro, a espera do acontecimento. Aconteceu. Gritei, desliga. O chuveiro pegou fogo, derreteu em parte. Por pouco esse gambiarreiro, aliás, aprendiz de gambiarras quase bota fogo na casa. Desde então, sempre que tenho algo pra fazer, que eu não saiba, procuro um profissional. 
     Quanto as minhas gambiarras literárias, delas não desisto. 


J Estanislau Filho


Da esquerda para a direita: Darquinha, Allison, Rui, Sebastião, o autor e Dona Maria


quarta-feira, 21 de junho de 2023

O Oco do Vaso

 
“Quem vive na plenitude do seu Ser
Vive como criança recém-nascida.
Víboras venenosas não a picam,
Feras selvagens não a atacam,
Aves de rapina não a agarram.”

Lao-Tsé


Imagem: Portal Resiliência



não sou santo
nem Cristo
para dar a outra face
mas insisto
em fazer poema.
é o amor que me fascina...
as aves de rapina
vivem em solidão.
não vivo o dilema
da dor da rejeição,
parte do problema,
que dilacera o coração...

é o amor que nos acorda!

não tenho receita
não sei a fórmula
desconheço seita
que cure pústula...

não encho o vaso além da borda!


J Estanislau Filho





quarta-feira, 14 de junho de 2023

Meu amigo vira-lata





Meu amigo vira-lata,  ao me ver de cara amarrada, 
vira a cara.
Faz greve, não vira lata,
não derruba objetos,
não revira o lixo.
E se enrosca em sua toca,
não troca carícias, não toca a ração.
Que cão cheio de manhas!
Mas se assanha quando grito:
“saia já daí e vamos passear”.
Com seu focinho frio,
toca meu rosto, me lambe.
Sinto arrepios.
Feliz, cheira meus livros, sobe na poltrona,
faz xixi no tapete.
Late!
Dá-me uma vontade dar-lhe um tabefe.
De tão feliz se esquece de usar o xixizeiro.
Deixo o tapete de molho e andamos pelas ruas de olhos em tudo,
e se alguém se aproxima,  para falar comigo
late e me fita, como se dissesse:
“fique tranquilo,  aqui estou para defender meu amigo”.
Depois de intensa caminhada, voltamos para casa.
Ele quer água e comida na mesa.
(Cão folgado, ainda faz cara feia!).
Come, bebe água, come mais, bebe mais e de barriga cheia,
vai dormir,  depois de me sorrir.
Cai em sono profundo...
Entra em outro mundo.
Um mundo de sonhos, pois rosna dormindo,
abana o rabo, as pernas se abrindo.
Cão sem rabo é como árvore sem galhos.
Chega mesmo a latir. 
Sonha que sou um vira-latão.
Ah, como gosto desse vira-lata.

J Estanislau Filho

Do meu livro Palavras de Amor


segunda-feira, 12 de junho de 2023

O egoísmo de cada um. Qual é o teu?




Sei que gostarias de ouvir palavras que elevassem a autoestima; palavras de alegrias e belezas, ou ainda, palavras de amor. Acontece que estou triste. E se pensas que estou triste por causa das guerras; da fome no mundo; da exploração capitalista ou por causa de muitos jovens afundados nas drogas, adianto que estás enganada.

    Nem penses que estou triste por conta da natureza agredida. Danem-se os mendigos, que viram tochas humanas, por incendiárias mãos desumanas. Afinal, o que eu tenho a ver com isso?

   Não me digas que a saúde do povo vai mal; que faltam vagas nos hospitais. Arre! estou farto de ouvir que o filho matou o pai; que o pai estuprou a filha; que a violência é geral. Por favor, me poupes notícias de corrupção.

    Por favor, não me lembre dos cães e gatos maltratados; da exploração sexual e do trabalho escravo e do tráfico de órgãos humanos. Nem tente me convencer, que tenho de defender os recursos hídricos; a flora e a fauna. Que se lasquem!

    Estou triste por um único motivo: egoísmo. É isso mesmo. Estou triste porque não tenho um carro zero; um iate; por não poder ter ao meu lado as mais belas mulheres, bebidas caras e não poder conhecer as oito maravilhas do mundo. Eu quero é ter. Do bom e do melhor. A mais fina seda; os mais belos cristais; ouro e diamante. Cartões de créditos e débitos, com muito dinheiro no banco. Aliás, eu queria ser dono do Bradesco; sócio da Microsoft e único dono do Facebook. Queria a Guanabara toda pra mim. Lá eu receberia quem eu desejasse.

    Tenho ou não motivos de estar triste?

   Ah o egoísmo! Que coisa terrível no coração e mente de homens ocos. Que tristeza!






J Estanislau Filho



Homens ocos

Nós somos os homens ocos
Os homens estofados
Uns aos outros apoiados
Crânio recheado de palha
Ai de nós!
Nossas vozes secas
Frouxas sem sentido
São vento em capim seco
Pés de rato pisando
Em nossa adega seca
 
Figura sem forma
Sombra desbotada,
Força entorpecida, gesto sem expressão
 

Assim é que o mundo acaba:

não com um estrondo, mas com um gemido


TS Eliot





quarta-feira, 7 de junho de 2023

A fila está andando

 Por Moisés Mendes




Deltan Dallagnol furou a fila. Arthur Lira, que havia voltado para a fila, levou um susto do Supremo e deve continuar assustado.

Bolsonaro tem data para virar santinho do bolsonarismo e Sergio Moro sabe o que o espera depois do purgatório.

Os enfileirados estão andando, com algumas reacomodações, como essa que livrou Lira. Mas não há mais como parar a fila.

As circunstâncias são terríveis para os que aguardam o desfecho de seus casos na Justiça Eleitoral ou estão sob o cerco da Polícia Federal ou enfrentam investigações e processos em outras frentes. Chegaram ao ponto do não retorno.

Dallagnol caiu e continuou atirando a esmo. Bolsonaro vai cair e pedirá que Valdemar Costa Neto finja que atira por ele nos que o abateram.

Não há muito o que fazer para tentar impedir o que está no roteiro. Não há como poupar Bolsonaro e Moro sem que a Justiça Eleitoral fique irremediavelmente sequelada.

A fila vai andar porque há mais gente para entrar e porque o TSE não pode fazer agora o que fez em outubro de 2021, quando poupou a chapa Bolsonaro-Mourão.

Depois daquela anistia, a extrema direita investiu contra o Supremo e contra o TSE. Acionou todas as armas sujas contra a instituição que defende a eleição.

Atacou diretamente ministros que atuam nas duas cortes. Desqualificou as autoridades e o sistema e o processo eleitoral.

A extrema direita desafiou e afrontou a Justiça Eleitoral para esculhambar com o que a Justiça precisa defender para justificar sua existência.

Os extremistas fizeram a aposta: vencer de qualquer jeito e, a partir da reeleição do sujeito, mandar o jipe com o soldado e o cabo para pisar nas togas do STF e do TSE.

A eleição e as Cortes sobreviveram, e Lula foi ressuscitado. Não há como oferecer outra chance ao fascismo que empurrou os manés para o 8 de janeiro.

A fila que Dallagnol furou e onde estão Bolsonaro e Sergio Moro deve andar também na área criminal.
Arthur Lira e os robôs superfaturados de Alagoas sabem que a Polícia Federal não vai parar. Os manés transformados em réus também sabem.

Os manezões, ainda fora da fila, sabem mais do que todos os manezinhos presos ou com tornozeleiras.
Em algum momento os manezões terão de se enfileirar. Manezões civis e fardados, uns com dinheiro e os outros com fardas e pijamas, vão entrar na fila.

Lira foi poupado porque a munição não deve ser desperdiçada agora com um caso de 2012. Por isso o STF, que já havia encomendado sua alma, decidiu recuar.

Lira, chefe do cangaço do centrão, não é uma prioridade, pelo menos não para a Justiça Eleitoral e agora. Não nesse caso.

A fila precisa seguir em frente. Aí vem Tacla Duran, para empurrar Sergio Moro, agora com a proteção de habeas do STF para que possa depor na Câmara contra o ex-juiz suspeito.

Duran será ouvido dia 19, na Comissão de Administração e Serviço Público. No dia 21 começa o inverno. E no dia 22 o TSE torna Bolsonaro inelegível. Que a primavera cuide do resto.



Fonte> https://www.blogdomoisesmendes.com.br/a-fila-esta-andando/