segunda-feira, 13 de janeiro de 2020

Seleção do Autor: 11 poemas sociais






perplexidade


árvores desarvoradas se desenterram
folhas mortas de cansaço
do fundo da terra brotam larvas floridas
ervas daninhas se alimentam do caos
o leão de pedra devora o escultor
a plebe ignara ignora boa conduta
assassinos elegantes se indignam
pássaro de lata rompe as nuvens
pássaros de penas voam sem olhas as asas
tiranos fazem planos
todos querem o seu quinhão
o ribombar do canhão ecoa
conspiração!




poesia à prova de balas


Não usarei colete à prova de balas,
pois a poesia é o meu escudo,
rifles, espingardas, pistolas
e revólveres não resolvem, nem revolvem
o amor que a poesia dissemina,
não espantam quem têm
as palavras lúcidas,
de afetos e lúdicas.
Não fugirei de medo, pois a poesia
é coragem, defesa de quem preza a vida.
Metralhadoras, submetralhadoras, tanques
não estancam poemas, dádivas da criação.
Já vivemos tempos ásperos n'outros tempos,
que retornam camuflados em sorrisos,
mas ato falho, revelam ódios, escárnios.
Nossa força, encarnada em versos mágicos
desvia balas, que ricocheteiam
em direção aos paraísos fiscais.
A poesia não é mercadoria, moeda de troca, jamais.
O poema não é neoliberal
Poesia é vida no sentido literal



meritíssimo

abaçada nomenclatura
de idiossincrática figura
[outrora capitão-do-mato]
ao retirar a toga a beca
gravata e cueca
não tinha o domínio do fato.
patético meritíssimo transigia
ao sentir a dor da disuria
[momento de carantonha]
mira o vaso sanitário canhestro humano
em prolixa descomunal litania
de escandalizar catrumano




rumores

faca de dois gumes
quando cega
não corta legumes.
cuidado minha nega
se o efeito de pega
a cabeça dança
os olhos balançam
; menina
o vaso se que se quebra
no limiar da janela
sob o lumiar da vela
incendeia a cortina

na estrada o estrondo
dilacera talebãs
debaixo dos escombros
do edifício incongruente
dormem vilões e inocentes

mundo nas mãos
mudos corações
refletem anseios desconexos
conectanto semblantes perplexos
peregrino persegue prossegue
em seu fundamentalismo banal
o neoliberalismo consegue
impor o seu fundamentalismo fatal

afagar afegões e afegãs
com missas massas e mísseis

tênues lágrimas incendiárias
internam-se em fundas fendas
ferindo feras centenárias

trilhando trilhas herméticas
encarquilhaodos trapos visionários
talham desenhos antagônicos
revelado suas metas fanáticas

agitadas mãos sobre a tela
traçam riscos históricos.
a caneta rompe o papel
outrora tronco outrora vegetal

num cálculo matemático











Vale

A Vale,
outrora do Rio Doce
era nossa.
Hoje só vale
promessas nos comerciais.
Vale,
vala comum
de lucros colossais.
Vale,
vela volátil
valha-me Deus,
muitas velas para poucos uns
breu e bruma para muitos alguns.
Vale,
verso versátil...
Não vale a pena verso
para vale adverso
valeria se vale fosse
do Rio Doce.
Fosse nossa
não seria vale de lágrimas.
Vale cada vez mais
verde covarde
amarelo sangue
suga os recursos naturais







pele negra


quem tem a pele negra
verdade seja dita:
sofre preconceito de nascença
esta é a regra
no emprego o branco tem preferência

quem tem a pele negra
sejamos francos:
o negro se desespera
na disputa com o branco

a mulher sendo negra
sejamos sinceros:
sofre mais discriminação
inclusive dos parceiros
lógico, com exceção

sendo negra a criança
há que duvide disso?
sofre bulyng sem perdão
perde a esperança
de tornar-se pleno cidadão


quem tem a pele negra
sabe bem da sua dor
e onde mais sangra:
a maldade do opressor
a porta que se fecha
o machuca como flecha

quem nasce com a pele preta
com um sorriso branco na boca
não se curva nem se aboleta
não se esconde dentro da toca
levanta a cabeça e vai à luta

quem tem a pele negra
tem a ginca e a manha
aprendido à duras penas
nas tardes noites e manhãs...
segue lutanto pelo seu ideal
pelos direito humanos
e pela igualdade racial


O Mar da História


O mar da história segue
sangra...
Quem tem carta debaixo da manga
ladra no silêncio noturno.
O cruzeiro do sul
indica o norte aos piratas pirados
jamais parados sob céu azul.
Desnorteia misseis e missais
dos lobos em peles de cordeiros...
Pobres logos
animais ordeiros
seguem seus instintos
enquanto dos distintos
do topo da pirâmide social
saqueiam pobres mortais...
E os piratas pirados acendem a pira paranoica
para harmonizar todos os quintais...
O mar da história segue
seu curso rompendo ondas
deixando um rastro de sangue
em sua desvairada lógica
rumo aos campos de petróleo...
[rumo ao pré-sal]










poesia rima com democracia


cidadão ou cidadã
seja você quem for
numa noite ou manhã
responda-me por favor
se elas forem frias
é mais útil um cobertor
ou centenas de poesias?

bom mesmo seria
todas as coisas juntas
com essa tal democracia
lutarmos contra quem a afronta
com a cara da hipocrisia
unidos cobrarmos a conta
e termo comida e poesia




Pequeninos carvoeiros


Silencia minha alma, coração.
como faz o vento ao balançar as folhas de árvores centenárias,
levando sossego às raízes

Quero o silêncio das aves migratórias,
quero a paz dos corações bondosos
e dos amantes reconciliados

Silencia minha alma, coração,
as respostas não cairão do céu
para perguntas inviáveis

Deixa o barco seguir o curso do rio,
mas como dói ver crianças com olhilhos de fumaça
rostinhos de carvão






não desistam da poesia



"Realmente, vivemos tempos sombrios!
A inocência é loucura. Uma fronte sem rugas
denota insensibilidade. Aquele que ri
ainda não recebeu a terrível notícia
que está para chegar".
(Bertold Brecht)

Vivemos dias obscuros. Obscenos.
Corações plúmbeos. Pulando obstáculos,
para não cair nas garras do ódio!
Correr atrás do pão de cada dia.
A prioridade é alimentar o corpo.
Mas como saciar a fome e a sede da alma?
Poesia não enche barriga,
dizem os de barriga cheia.
Não desistam da poesia. Ela é uma barricada contra
os bárbaros,
que não vê com bons olhos.
Sem poesia a alma seca,
os desejos, mesmo os mais humildes, não se manifestam.
Aos humilhados o que resta é a servidão.
As sobras das sobras dos banquetes de gente perversa,
que é a sobra do que sobrou dos capatazes da elite.
Não desistam da poesia. Ela é companheira
dos indignados. O alimento necessário à luta por transformações.
Não desistam, pois é isso que um por cento da população quer,
apoiada por seu séquito de capachos.
Está ouvindo tiros? Ouve o grito dos desesperados?
Quem morre e quem vive, eis a questão.
Quem ganha e quem perde nestes dias sombrios...



Segundo Manifesto


O novo se apresenta
Traz no bornal ideias velhas
Pneu recauchutado
Ovelhas se deixam tosar
O velho rebelde olha de viés
O novo é o velho mandatário das companhias hereditárias
Vem com seu sorriso falso em mensagens virtuais
Sofista com tecnologia moderna
O mesmo profeta do apocalipse em 4g
Sofisticado e sedutor
A corromper cérebros
O novo velhaco se apresenta
Não traz espelhos
Vem com smartphones
Fibra ótica
Playstation e
Porque tv ninguém mais aguenta
O velho rebelde não se deixa enganar
Olha de viés e lhe mete os pés na bunda







                                                    Imagens: arquivo do autor


J Estanislau Filho



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