terça-feira, 16 de junho de 2020

Janelas Abertas


As flores anteciparam a primavera e querem ocupar a cozinha da casa em que moro. A mesa de ardósia fica em frente à janela. É neste lugar que gosto de iniciar meus textos em meu caderno de exercícios. Continuo usando a velha e boa caneta, para registrar o que dita o coração. Depois, sim, faço uma revisão, uns adornos aqui, outros acolá, na tentativa de seduzir os leitores e as leitoras. O micro aperfeiçoa os detalhes
    Passo boa parte do meu tempo neste lugar. Digo boa parte, porque são momentos realmente bons. Geralmente ao anoitecer. Coloco um disco: mpb, rock progressivo, clássico pop e escrevo o que me vem à mente. Sem planejamentos. Planos são úteis para a vida cotidiana. A arte não carece disso, ao contrário, ela se manifesta por meio do dom. No instante em que escrevo esta crônica, ouço feng shui – música para harmonizar o ambiente da sua casa, como está escrito na capa do CD. São oito faixas de músicas suaves, ao som de água de cachoeira, canto de pássaros, piano, sinos, flautas, cordas... Luara e Lola – duas cadelas de pequeno porte – se irritam com as pulgas, logo em seguida se aquietam. Elas, também, entram em transe ao som da música.
Não costumo datar meus textos, talvez por desejá-los atemporais. Aliás, o tempo só existe externamente. Não há tempo interior e caso exista, manifesta-se de outra forma. Penso que o tempo é uma ilusão dos sentidos. Lógico que existe ontem, hoje e amanhã. Na vida prática precisamos de calendário, de horários. O tempo interior não tem conexão com o exterior. Não sei se estou conseguindo me fazer entender. Se não estou, paciência.
     Tente esquecer esse tempo externo e se deixe levar ao interior. Sinta a fluidez. Não há tempo. Loucura? Não, ao contrário. Loucura é a pressa. Loucura ficar escravo desse tempo externo, sem tempo para o interior. Mas não é sobre isso que quero escrever.
     Quero falar de janelas abertas. Em sentido metafórico, janelas são os corações das pessoas. Repararam como as janelas abertas nos convidam a entrar? Janelas fechadas afastam os passantes. Menos os arrombadores. Na casa em que moro as janelas estão sempre abertas. Inclusive à noite. Não as fecho por nada. Nem quando saio de casa. Os arrombadores se assustam, não se aproximam. Os antropólogos e os psicólogos devem explicar isso melhor.
     Assim como as janelas da casa em que moro, meu coração está aberto, como escrevi no poema Bakunin, para o amor entrar, mesmo que entrem alguns ovni’s, para eu identificá-los.


J Estanislau Filho




Imagem: JEF - janela da casa, que não existe mais, onde morei-Esmeraldas-mg

15 comentários:

  1. Sagrada é a arte atemporal! Não há companhia mais colorida e perfumada, do que as flores, adentrando as janelas. E que o coração esteja sempre aberto! Lindo e sensível texto Stan. Meus parabéns. Abraço.

    ResponderExcluir
    Respostas
    1. Obrigado, Luíza, amiga e parceira de letras. Sempre bom receber sua visita. Abraço fraterno!

      Excluir
  2. Muitíssimo obrigado, Maria Claudia. Boa noite.

    ResponderExcluir
  3. Maravilhoso! Que as janelas de nossas almas estejam sempre abertas para a paz, o amor e o bem. Aplausos mil, nobre poeta

    ResponderExcluir
  4. A tua arte é linda, um convite a entrar e se deleitar com a paz , a beleza, com o sentimento de amorosidade que dela transborda. Parabéns!

    ResponderExcluir
  5. Lindo texto. Concordo plenamente com você. O tempo interior não existe, é por isso que as vezes voltamos no tempo para ver aqueles que partiram dessa vida ou que deixamos para trás. Janelas abertas também adoro. Sempre uso as imagens delas, principalmente com lindas cortinas, talvez para criar mistério...rs abraços! Parabéns! Boa semana!

    ResponderExcluir
  6. Delícia de texto amigo, que entre amor renovacao é.muita alegria na sua vida.

    ResponderExcluir
    Respostas
    1. Obrigado pela generosa presença aqui, Letícia. Volte mais vezes.

      Excluir