terça-feira, 23 de dezembro de 2014

As Rosas Falam



No momento em que eu secava o suor da testa, depois de preparar as dezoito covas, para o plantio das dezoito mudas de rosas vermelhas, brancas, rosas compradas na Flora Jardins do Éden, Débora arrumava as malas.
     No momento em que eu terminava de plantar a última rosa, um mensageiro me entregou um envelope com uma mensagem de Débora, que li após beber um copo de água cristalina e limpar novamente o suor da testa com um lenço de papel. Na pressa de saber o conteúdo, fiz uma leitura dinâmica. Como o meu coração parecia querer sair pela boca, respirei e li pausadamente cada palavra. Olhei as rosas, e, por um instante tive a impressão de ver lágrimas escorrerem das pétalas.
     Débora era assim: para certos assuntos preferia as cartas manuscritas, seladas e enviadas de forma tradicional, em vez de usar o correio eletrônico ou o celular.Acontecia de pagar um mensageiro, quando o assunto era urgente.
     Quando me sugeriu, quase em tom de súplica, o plantio das dezoito rosas enfileiradas, que nos conduziriam ao limiar da porta de entrada de nossa nova casa, cujos ambientes foram pintados de acordo com as cores das rosas, Débora disse, após beijar-me sensualmente, que éramos o casal mais feliz do mundo. Ela quis o nosso quarto cor de rosa rosa; eu pintei a sala e a copa de branco, enquanto ela pintava a biblioteca de vermelho. A maior parte da pintura foi eu em quem realizou, mas as pinturas de Débora ficaram primorosas. Na parte externa distribuímos as três cores e fizemos o mesmo com as grades e o portão. Nós a chamávamos de A Casa das Três Cores, que daria um novo alento ao nosso amor, que nos três dos dezoito anos de casados caíra em uma rotina tediosa.
     Plantei-as intercalando as cores como Débora pediu-me. Na verdade, os pedidos dela eram exigências. Eu não contrapunha, pois ela tinha um senso estético extraordinário. A casa estava bonita. Só faltavam os móveis. Combinamos botar fora os antigos, para apagarmos as boas e más lembranças deste período. Vida nova, dizíamos entre beijos e abraços.
     No momento em que refletia sobre o nosso novo projeto de vida, Débora pegava um táxi e se dirigia ao aeroporto internacional, rumo à França, onde faria pós-graduação de arquitetura na Universidade de Paris. Débora detestava despedidas.
     Quando fui ao Jardins do Éden escolher as rosas, o florista orientou-me como tratá-las: Rosas são frágeis como o amor. Se não cuidar com zelo elas morrem.
     Escolhi uma a uma, as mais viçosas. Eu as queria homogêneas e esplendorosas, para formar uma linda passarela. Comecei a andar em círculos, refletindo sobre a mensagem de Débora, quando reparei que havia algo mais dentro do envelope. Era um pequeno  envelope de papel crepom lilás. Ao abri-lo, levei um baque: lá estavam as alianças destinadas a selar os nossos compromissos e o anel de brilhante que eu lhe dera ao completarmos três anos de casados. Todas as noites, ao me deitar, adquiri o estranho hábito de retirar a aliança e depositá-la sobre o criado. Acontecia de esquecer de colocá-la no dedo ao me levantar e ir para o trabalho. Débora não se conformava.
     Dentro do envelope havia um bilhete em um minúsculo papel, com as letras miúdas de Débora, obrigando-me a colocar óculos, para ler. Débora pedia para que enterrasse as alianças na primeira rosa vermelha e o anel na primeira rosa branca. Na primeira rosa cor de rosa eu deveria plastificar o bilhete e enterrá-lo.
   Tive dificuldades de ler a última frase: "Compre alianças grossas do mais puro ouro e me surpreenda com um novo anel. Até breve, beijos daquela que te ama muito.
      Fiquei um longo tempo admirando as rosas enfileiradas, ouvindo-as dizendo entre si: Isso é amor!


J Estanislau Filho - do livo Crônica do Amor Virtual e Outros Encontros -Editora Protexto.

25 comentários:

  1. Que linda história de amor Estan.Como precisamos desfrutar de lindos contos assim...Feliz Natal meu querido amigo que Deus na sua infinita bondade posso lhe cobrir de grandes bençãos.Um grande abraço!

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  2. A personagem Débora quer um vínculo sereno de seu narrador, onde as rosas silenciam a beleza desse amor, e o sonho do alcance de ser amada numa expectativa de alianças construídas no coração. Querido Escritor Stan, este é mais um belo presente aos teus leitores e outros tantos que virão... Beijos da Luiza Michel

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    1. Obrigado pelas pelavras generosas, Luiza, volte sempre. Feliz 2015.

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  3. Gostei de reler, pela suavidade, pela beleza das imagens criadas.Obrigada por compartilhar suas pérolas!Beijo, FELIZ 2015!

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  4. Obrigado pela leitura. Alegria vê-la aqui. Volte sempre.

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  5. Um dos textos mais lindos deste livro, juntamente com O voo da borboleta, Delírios de Rosas, O hóspede, Mancuspias,.....e etc etc etc.

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    1. Que bom, então gostou do livro quase todo. Valeu a presença, Regina.

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  6. As rosas não falam: sussurram..e só que te ouvidos na alma pode escutá-las.
    Linda crônica de amor. Sempre aplaudindo seu talento e sensibilidade, poeta.

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  7. Romantismo do mais bonito que possa existir. Amei.Ceição.

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  8. eu tenho uma amicíssima Poeta com dois belos livros publicados que fez os maiores elogios ao seu conto. Parabéns, Verly

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  9. Stan, um conto esplêndido. Apresentação, clímax e o desfecho estão perfeitos.
    A protagonista tem um nome forte e a personalidade também. Uma bela e sensível história de amor. Parabéns. Abraços

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    1. Obrigado pelas palavras generosas, Anna. Seja sempre bem-vinda.

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  10. O amor renovado _ a essência de um relacionamento. Volto a dizer : um dos seus mais belos textos.

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  11. Um maravilhoso conto, detalhadamente bem escrito... Beijos

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  12. Voltando a reler está preciosidade, lindíssimo conto, cantado com a linguagem do Amor Puro e Verdadeiro, do qual eu acredito... Parabéns JEF

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  13. Fiquei encantada e "As Rosas Falam". Texto perfeito e belo por excelência. Senti a necessidade do​ Amor verdadeiro e puro.Um conto precioso e apaixonante. Amei! Parabéns! Vou reler. Boa noite e beijos Estan.

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  14. Fiquei encantada e "As Rosas Falam". Texto perfeito e belo por excelência. Senti a necessidade do​ Amor verdadeiro e puro.Um conto precioso e apaixonante. Amei! Parabéns! Vou reler. Boa noite e beijos Estan.

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  15. Obrigado pela presença e comentário generoso, Gernaide, beijos.

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